
É recorrente a reclamação de consumidores que adquirem carro zero, no sentido dos veículos apresentarem sucessivos defeitos após alguns meses de uso. Comumente os veículos apresentam defeitos no motor, embreagem ou freios, colocando a vida e a segurança do condutor em risco, além é claro de causar certo stress.
Ao que tudo indica, nestes casos, os veículos saem das fábricas já com defeito, o que tecnicamente chamamos de “vício oculto”, ou seja somente após algum tempo de uso o problema é constatado.
A maioria dos consumidores reclama que constatado o defeito, os veículos, ainda em garantia, são levados as oficinas autorizadas que realizam o conserto, mas não resolvem o problema. Isso quando não extrapolam o prazo legal para realizar o conserto.
Conforme já tratamos aqui noblog, nos termos do artigo 18 § 1º do Código de Defesa do Consumidor determina que expirado o prazo de 30 (dias) a contar da entrada do veículo na oficina autorizada, o consumidor, tem direito a rescisão do contrato, substituição do bem ou abatimento do preço, vejamos:
“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o CONSUMIDOR EXIGIR, alternativamente e À SUA ESCOLHA:
I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III – o abatimento proporcional do preço.(…)”
É de salutar importância destacar que a lei é clara ao determinar que a opção é do consumidor. Observe que a lei utiliza o verbo EXIGIR. Assim se o consumidor, por exemplo, optar por um novo veículo a concessionária ou fabricante não pode lhe oferecer abatimento do preço. Outro detalhe importante é que havendo sucessivos defeitos, mesmo que o conserto seja finalizado o consumidor não perde o direito previsto no artigo acima mencionado. Isso porque é dever dos fornecedores (fabricante e comerciante) não colocar a venda produtos que ameacem a saúde e a segurança do consumidor.
Foi este o entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais ao julgar o tema:
EMENTA: AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL, CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALOR. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO ZERO QUILÔMETRO. VÍCIO NO PRODUTO NÃO SANADO, MESMO APÓS INÚMERAS VISITAS A OFICINAS AUTORIZADAS. DEVOLUÇÃO DO PREÇO PAGO PELA ADQUIRENTE E DEVOLUÇÃO DO VEÍCULO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. APLICAÇÃO DO ART. 18, § 1º, II, DO CDC. RECURSO NÃO PROVIDO.- Concede-se ao fornecedor a oportunidade de sanar o vício no prazo máximo de trinta dias. Não sendo reparado, poderá o consumidor exigir, à sua escolha, as três alternativas constantes dos incisos I, II e III do § 1º do artigo 18 do CDC.Constatada, através de prova pericial, a existência de vício no veículo zero quilômetro adquirido pela parte autora, sem solução do problema pela fornecedora, mesmo após inúmeras visitas a oficinas autorizadas, é legítima a opção da requerente pela rescisão do pacto, com a restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, na forma do art. 18, § 1º, II, do CDC. –(TJMG- Apelação Cível 1.0188.07.066365-6/001, Relator(a): Des.(a) Veiga de Oliveira , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/03/2014, publicação da súmula em 02/04/2014).
Não podemos deixar de mencionar que o consumidor que adquire um veículo zero tem sua expectativa frustrada em razão das sucessivas entradas do veículo na oficina, sem êxito. Por esta razão o judiciário além de determinar a troca do bem ou a devolução do valor desembolsado para compra do veículo, sempre à critério do consumidor, tem fixado indenização por danos morais.
Infelizmente, em razão das péssimas condições do transporte público, as pessoas têm optado por se deslocarem para o trabalho, faculdade, etc, utilizando-se seu veículo, economizam tempo, ganham conforto, e em algumas situações economizam dinheiro. O consumidor que adquire um veículo zero tem, a expectativa de usufruir imediatamente do bem frustrada, tendo em vista que, o produto adquirido após algum tempo de uso começar apresentar problemas recorrentes.
Ora, ninguém investe dinheiro na aquisição de um produto novo esperando que ele venha a apresentar defeitos, diferentemente de quem compra um veículo usado. Ademais, normalmente os veículos apresentam defeitos em peças estruturais conforme relatos do site Reclame Aqui, o que coloca em risco a vida e a segurança do condutor. Com base nesse raciocínio, os tribunais têm condenado fabricantes e concessionárias ao pagamento de indenização por danos morais em favor do consumidor que adquire veículo zero com defeito. Vejamos algumas decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, neste sentido:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REDIBITÓRIA – DANOS MORAIS E MATERIAIS – VEÍCULO “ZERO QUILÔMETRO” – DANOS CONFIGURADOS – FRUSTRAÇÃO AO ADQUIRIR BEM DEFEITUOSO – QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1.(…) 2. Quando o consumidor adquire um veículo novo, além do conforto esperado, deseja também não ter problemas com este por um longo tempo. Diferentemente acontece, quando se adquire um veículo usado, sabendo, previamente, que aquele bem pode não ter sido conservado adequadamente. 2. Pelos documentos acostado aos autos, entendo que restaram, satisfatoriamente, comprovados os vícios no veículo. 3.(…). (TJMG- Apelação Cível 1.0702.08.527910-8/001, Relator(a): Des.(a) Mariza Porto , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/11/2014, publicação da súmula em 13/11/2014).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO NOVO. VÍCIO DE QUALIDADE. SOLIDARIEDADE PASSIVA. DANO MATERIAL. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. (…) A aquisição de veículo zero-quilômetro que apresenta avarias incompatíveis com veículo novo, não pode ser relegada ao plano do mero aborrecimento, caracterizando ilícito civil e dano moral passível de reparação. A indenização por danos extrapatrimoniais deve ser suficiente para atenuar as consequências das ofensas aos bens jurídicos tutelados, não significando, por outro lado, um enriquecimento sem causa, bem como deve ter o efeito de punir o responsável de forma a dissuadi-lo da prática de nova conduta. (…) (TJMG-Apelação Cível 1.0372.12.001139-3/002, Relator(a): Des.(a) Domingos Coelho , 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/12/2014, publicação da súmula em 12/12/2014).
Além do dano moral ocasionado pela frustração da expectativa e stress, o consumidor também tem direito de pleitear o ressarcimentos dos gastos que teve enquanto o veículo estava no conserto, tais como: aluguel de carro, táxi, passagens, guincho, etc.
Portanto o consumidor, que adquire veículo zero com defeito tem direito de pedir seu dinheiro de volta ou a substituição por um veículo novo em perfeito estado de uso, bem como pode pleitear indenização por danos morais e materiais ( ressarcimento de gastos).
Nestes casos tanto o fabricante quanto a concessionária são responsáveis pela solução do problema , nos termos do artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Contudo, antes de ingressar na justiça é sempre importante registrar uma reclamação junto ao SAC (serviço de atendimento ao consumidor) ou na ouvidoria da empresa.
Importante também ficar de olho nos prazos para reclamar. Em se tratando de produto durável, como é o caso de veículos o prazo para reclamar eventuais direitos é de 90 (noventa) dias, começando a contar a partir do momento que o consumidor tem ciência do problema. Não fique à pé exija seus direitos!!!!
Nair Eulália Ferreira da Costa
Advogada militante em Belo Horizonte. MG. Direito do Consumidor, Direito Imobiliário, Direito da Saúde. Pós-graduada em Direito Processual pela PUC. MG. Autora do Blog Defesa do Consumidor. Articulista na plataforma JusBrasil. Contato: [email protected] ou (31) 3309-5975. Não respondemos dúvidas por telefone, agende sua consulta. Acompanhe nosso blog pelo facebook e seja o primeiro a ler nossas postagens.